Lugar de fala: Como apoiar uma causa que não é sua

Como apoiar uma causa

Como apoiar uma causa que não é sua

Semana após semana posts das redes sociais são bombardeados por questionamentos sobre lugar de fala e como os demais grupos podem apoiar uma causa sem interferir na luta por equidade de grupos marginalizados socialmente.

Sou uma mulher branca, apesar da descendência negra, minha pele clara me permitiu privilégios que para muitos é difícil reconhecer.

Quando falamos em privilégio, as pessoas logo pensam em facilidades e não conseguem enxergar que algum ponto da vida poderia ser muito mais difícil se ela tivesse determinada característica.

Afinal de que privilégios estamos falando?

Dias atrás entrava em um local com detector de metais na entrada. Quando passei o alarme disparou. Sabe o que aconteceu? Nada. O segurança liberou minha entrada sem sequer conferir minha bolsa.

Em outra circunstância fui abordada na entrada de um supermercado e me pediram que guardasse a mochila que carregava. Me recusei. Sabe o que aconteceu? Nada. O segurança respeitou meu desejo de permanecer em posse da minha mochila e liberou minha entrada.

Você não enxerga nenhum privilégio nisso, não é?

Alguns meses atrás caminhava por uma avenida e presenciei uma abordagem policial a um jovem negro de bicicleta. Vi os policiais abrirem sua mochila. Apenas uma troca de roupa. Um dos três policiais presentes na ação observou que a bicicleta parecia ter sido cara e pediu ao jovem a NOTA FISCAL da bicicleta. Ainda disse que sem a comprovação de que a bicicleta era mesmo dele seria necessário ir até uma delegacia para averiguações.

Quem sai pra pedalar, ou usa bicicleta como meio de transporte e leva junto a nota fiscal? E se você não enxergou racismo nessa situação, leia novamente.

Toda interação e imediatismo dos acontecimentos que as redes sociais e a própria internet nos promovem tem acelerado os debates sobre apropriação cultural, lugar de fala, racismo, machismo, homofobia e muitas vezes pessoas simpatizantes com os grupos que visam combater esses males não sabem como se posicionar ou oferecer apoio sem roubar o protagonismo da luta das minorias.

Afinal o que eu, pessoa branca posso fazer para combater o racismo na nossa sociedade? O que um homem pode fazer para combater o machismo? Um hétero para lutar contra a homofobia? É possível começar com três itens:

Em primeiro lugar

Ouça! Mas ouça de verdade, não passe toda a conversa tentando encontrar argumentos para deslegitimar a reclamação que está ouvindo. Se um negro está dizendo que uma piada foi ofensiva, se uma mulher disse que determinada expressão é machista, se um gay diz que se sentiu discriminado, ACREDITE.

Não estou dizendo para abrir mão de seu senso critico. Não estou dizendo para fechar seus olhos se evidencias apontarem que o que você ouviu não é verdade ou foi mau interpretado. Estou dizendo para praticar uma escuta empática, Para considerar os motivos que levaram essas pessoas a se sentir ofendidas e respeitar esse sentimento.

Em segundo lugar

Reavalie a si mesmo, constantemente. Se esforce para abandonar xingamentos, ditos populares, apelidos e posicionamentos preconceituosos. Mesmo que sua intenção não seja ruim, ou que você não queira perpetuar com algum preconceito essas situações dão margem pra que isso aconteça. Não use a sexualidade de alguém como ofensa. Não use a cor de alguém para desvirtuar uma situação. Não use a roupa ou comportamento sexual de alguém para minimizar uma ofensa ou agressão. Não determine o que alguém pode ou não fazer baseado em sua orientação sexual, sua etnia, sua identidade de gênero ou gênero biológico.

Terceiro

Sempre que for possível consuma bens ou arte produzida ou protagonizada por grupos hostilizados. Investir monetariamente nesses grupos é uma das melhores formas que lhes tirar da invisibilidade, de promover debates abertos, de financiar a militância das minorias.

Talvez algumas situações pareçam contrárias as suas crenças e posicionamentos, se isso acontecer, permita-se expandir sua mente: Leia o que diz quem concorda e quem não concorda com você. Essa ultima parte é importante: Avalie o que diz quem não concorda com você: Essa é a base do saber. E se ainda assim suas idéias permanecerem as mesmas lembre-se que esse é um direito seu, e de quem não concorda com seus ideais também. Então simplesmente respeite o próximo. Não precisa destilar ódio na internet ou no ponto de ônibus.

Esse é um começo, e não é muito simples, para que seja possível promover uma sociedade mais justa e plural, buscando garantir que esses grupos não sejam atacados unicamente por existir.

Muito mais pode, e deve, ser feito dentro de cada um dos recortes dessas lutas. Aqui abordo apenas um modo de começar, de reavaliar as dificuldades que nunca experienciamos apenas por sermos quem somos e que reforçamos mesmo sem intenção quando nos negamos a avaliar de forma contundente a cultura que faz parte do nosso dia a dia.

Esse é um exercício para começarmos a ser melhores. Ninguém perde nada com isso. Todos ganham.

 

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