A música de cada Porto

Em uma cidade de praia como Porto de Galinhas, turistas e pernambucanos aproveitam os benefícios da música, que parece tocar cada um em um ritmo diferente.

Em um sábado à noite agitado na cidade de Porto de Galinhas, muitas pessoas estavam na rua buscando alguma atividade para fazer. Ainda era janeiro, e com o carnaval se aproximando, a vontade de cair na folia aumenta entre pernambucanos e turistas. Mas, com poucas opções, a maioria acabou indo à praia ou sentando em bares e restaurantes com música cantadas ao vivo. O que, por aqui, não falta. A semana marcava as festividades pela Nossa Senhora do Desterro, muito querida pelos que moram aqui. Um palco estava montado numa das praças da cidade, mas ninguém sabia ao certo da programação aquele dia. Até que por volta das 20 horas, para alegria de todos que estavam na cidade, um show começou. Simone aparentava estar na faixa dos 45 anos, enquanto seu companheiro, na guitarra, 50. E com apenas uma guitarra e sua voz, Simone deu vida a cidade com os mais diversos gêneros musicais. Com funk, sertanejo de todos os tipos, forró, MPB e axé, o casal fez que uma pequena multidão se formasse em volta do palco.

A dupla começou atraindo a atenção de mulheres de meia idade, a maioria estava entre amigas. Depois, alguns jovens não resistiram e tiveram que admitir, o show era mais atrativo que a única balada da cidade. Aos poucos, pessoas de todas as idades e gêneros se aglomeraram para cantar de tudo. Em certo momento, começou uma seleção de músicas animadas, aquelas que todo mundo sabe cantar e dançar. Na frente do palco e apoiadas no chão estavam duas grandes caixas de som, elas tinham um metro e meio de altura por um metro de largura. Duas meninas brancas, uma de vestido florido, aparentava ter 10 anos, outra com uma jardineira, com no máximo 7 anos, sentaram em cima das caixas enquanto seus pais dançavam com os amigos.

Pouco tempo depois, na outra extremidade da praça, dois meninos negros com as mesmas idades sentaram na segunda caixa de som. Ambos estavam sem chinelo, com roupas velhas que não lhe serviam bem, o mais novo estava apenas com uma bermuda rasgada e apertada. Com seus cabelos mal cortados, eles se acomodaram para ver o show. Turistas que estavam por ali decidiram, quase instintivamente, mudar de lugar, uns foram para o meio da praça, outros simplesmente foram perto da outra caixa de som, onde estavam as meninas bem vestidas. O mais velho notou, passou a mão nas costas do mais novo, como quem diz que estava disposto a protegê-lo, e pegou do bolso uma guia azul clara, um adereço de contas usados para proteção em religiões afro descendentes, pela cor deveria ser de Iemanjá. Depois de um tempo segurando, a colocou no pescoço.

Cena do filme “Capitães da Areia” inspirado no livro com mesmo nome de Jorge Amado.

O mais novo dos meninos se encantava com o show, com o poder da cantora, que vestia azul claro, de animar o povo. Ele sentou virado completamente para o palco, como se soubesse que podia se divertir um pouco, pois o seu colega iria te proteger. Simone chamou seu filho, Arthur, 10, para cantar um pouco para cidade. O menino encantou a todos, deu um show de sertanejo universitário, com direito a dança e interação com a plateia. Nesse momento, o menino mais novo sentado na caixa de som, dava risada e se encantava ao mesmo tempo. O mais velho, aparentava estar chateado. Afinal, as pessoas que saíram de perto deles, duas crianças bonitas, também aplaudiam o filho da cantora. Logo, Simone voltou ao palco. Começou a cantar “Não quero dinheiro”, de Tim Maia. Nesse momento, ambos pareceram felizes por conhecer a música. Só sabiam cantar o refrão, mas parecia mais do que suficiente.

Algumas músicas depois, o mais velho desceu da caixa de som. No primeiro intervalo entre músicas, o mais novo, empolgado, perguntou qual era o nome da dupla que alegrava a noite da cidade nordestina e pediu para que voltassem. Simone e Cobra responderam com um sorriso no rosto, como se aquele fosse o primeiro a elogiá-los, ou pelo menos o mais importante. Ele desceu e seguiu seu colega mais velho para longe, animado pela noite que teve. Como se a  música tivesse lhe dado energia para seguir pelo resto da semana.

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