Quando o machismo começa em casa

machismo começa em casa

Oi pessoal, o post de hoje vai ser um pouco diferente, eu vou contar um pouco do machismo embutido em outras coisas que sofri a vida inteira, na minha própria família durante toda a vida (inclusive ainda vivo), sem querer, sem saber, sem eles perceberem que me tratam com essa diferença e espero fazer muitas pessoas verem como cada situação pode marcar uma vida pra sempre….

Cresci em uma família grande, dos dois lados eu só tinha primo… minha primeira prima veio por parte da minha mãe e temos 8 anos de diferença, a segunda 9 e a última é da parte do meu pai e temos 15 anos de diferença, e essa diferença de idade importa  muito porque eu nunca saí com elas pra balada na minha adolescência, eu nunca tive uma interferência feminina pra desabafar, pra chorar e contar dos namoradinhos (como todas fazem), eu não tinha com que brincar que não fossem menino, porque elas ainda eram crianças e hoje que são adolescentes eu já sou “adulta”.

Cresci entre esses dois mundos que mesmo sendo diferente me ofereciam fatos iguais. As brincadeiras na infância, desde sempre, eram pular muro, soltar bombinhas e pipas, estilingue, carrinho de rolimã, futebol, gol a gol, e muitas outras brincadeiras de meninos.. e eu? Eu sempre fui vista como a “menina moleque’ ou “mais macho que os meninos” a vida toda por toda a minha família… porque eu amava aquele mundo, eu era melhor que eles em quase tudo!

Eu nunca entendi porque eu era criticada quando jogava futebol. Eu amo futebol até hoje! Nem sei quantas vezes cheguei na casa da vó com uma camisa do meu time e tive de ouvir:

“Mulher de camisa de futebol é tão feio” (até hoje escuto), mas meus primos tinham várias e eles podiam usar sem serem criticados.

Meus primos (a maioria deles) dirigiram a vida toda, eles pegavam o carro de seus pais e iam pra roça, desde os 6 anos… todos eles já sabiam dirigir, mas eu, por decisão do meu pai, era melhor esperar pra aprender na auto escola (até hoje não entendo o porquê), quando tirei minha tão sonhada CNH (a única da família que tirou de primeira, diga-se de passagem), eu era a “barbeira” e até hoje eu sou, rsr mas eles dirigem melhor que eu porque eu sou mulher e não porque eles dirigiram a vida toda né?

Quando eu tinha 15 anos, em um carnaval, meu pai me viu bebendo ICE (ICE gentiiiiii, smirnoff ice), ele me tirou da festa e me levou pra casa da minha avó, onde estava toda a família fazendo aquela festança… ele veio falando o caminho todo o quanto era feio mulher bebendo e que eu era muito nova, mas quando cheguei na minha avó, todos os meus primos estavam bebendo e se divertindo, mas eu era feio demais, ainda mais menina bebendo pra rua gente!!

No natal, dia das crianças, meus primos ganhavam carrinhos de controle remoto, avião, bola, vídeo game, patins, patinete, bicicleta… Eu ganhei boneca durante um tempo, mas com quem eu ia brincar naquele dia se todos eles estavam no quintal com seus brinquedos divertidos? No dia-a-dia minha mãe é quem brincava comigo, mas no dia da festa eu largava meus presentes e ia brincar com os deles… e quando eles ganhavam esses mesmos brinquedos e eu ganhava uma roupa?? Gente, que criança quer ganhar roupa enquanto todas as outras estão com seus brinquedos? Mas eu era menina e precisava ganhar roupa de mocinha pra andar mais bem arrumada e não parecendo um moleque.

No decorrer da vida eu via meus primos em baladas pegando varias meninas, mas se algum amigos deles quisesse ficar comigo eles tinham ciumes, passavam a noite me vigiando, porque eu era menina e menina não pode ficar com qualquer um e eles sabiam que seus amigos não queriam nada sério comigo, só ficar mesmo, então, eu tinha de ficar escondido e se eles ficassem sabendo eu era sem vergonha, kkkk ôh fase!!

Com o tempo eu fui começando a questionar algumas coisas, mas até hoje sou criticada em vários assuntos…

 

Na adolescência eu fui criando uma personalidade forte, me afastando e retrucando todas as criticas, mostrando o que eu queria pra mim, mas sabem o que eu ganhei com isso? Até hoje eu sou a brava, enjoada, custosa, difícil de lidar, kkkk eu usava roupas pretas, porque comecei a ouvir rock e essa personalidade me invadiu, mas eu ouvia: menina, você só anda de preto? É muito feio menina só de preto!

Ouvia que não podia comer doce pra manter o corpo de mocinha, ouvia que não podia pular rampa de bicicleta porque era menininha, os meninos iam com meu tio aos estádios ver jogos de futebol e eu ficava com a família procurando por eles na TV… eu era menina macho porque gostava de andar descalça, de pisar no barro, de animais (e isso virou minha profissão de tanto que amo), eu tinha (e ainda tenho) de sentar de pernas cruzadas enquanto eles podem sentar confortavelmente.

Tudo isso e mais um pouco se deu durante toda a minha vida e hoje ainda passo por tudo isso e pra piorar vejo as primas mais novas passando, eu tento defender e mostrar pra elas que tem de se posicionar quando se quer uma coisa…

Tenho primas que não podem dormir na casa de outras tias porque lá só tem homem, elas não podem gostar de algum carinha mais velho que é feio e elas estão se oferecendo, elas não podem ficar na praça até tarde porque não é ambiente de menina, a mais novinha nunca gostou de bonecas de nem de vestidos, mas ela ama futebol e passa pelas mesmas criticas que eu, ela é não pode marcar de fazer um trabalho de sala na casa de um coleguinha porque a família acha estranho uma menina e um menino no mesmo grupo… como elas já cresceram sem a presença forte dos primos nas brincadeiras e no dia-a-dia, por serem mais novas, elas passam por menos comparações do que passava, mas ela também não podem andar de roupas muito curtas na rua…

E por falar em roupas curtas… a poucos meses atrás, estava visitando minha família, era comemoração do dia das mulheres, no programa que, a família reunida antes do almoço estava assistindo, mulheres diziam que não se conformavam em não poder usar o que querem, no mesmo momento MEU PAI, que sempre me incentivou a lutar pelo direito das mulheres, me solta um: “essas mulheres também, ficam aí dizendo que querem respeito mas adoram andar na rua de roupinha curta para que os homens mexam com elas, elas adoram quando eles mexem!” Oi?? Pai?? Como assim? Respondi na hora que é justamente por não gostar que lutamos por isso, pelo direito de escolher a roupa que eu quiser sem ter de pensar se algum “doente mental” vai mexer comigo e me desrespeitar ou não… sabem o que ele fez? Saiu da sala pra não ter de me mandar calar a boca…

Meu próprio pai vive falando comigo: “fecha as pernas”, “vai com essa roupa?”, “mulher bebendo é tão feio”, “isso não é coisa de mulher”…

Meus primos faziam futebol e karatê, eu fazia ballet e jazz (e mais umas danças aí), eles estudavam inglês, pra poderem viajar o mundo, eu estudei inglês pra ir bem no vestibular, porque lugar de mulher não é viajando pelo mundo, eles escolheram faculdades de homens, engenharia, segurança no trabalho, administração, agronomia, eu não escolhi psicologia, pedagogia e nem fisioterapia, eu escolhi uma profissão de homem também, biologia!

Há machismo nas melhores famílias, há machismo no dia-a-dia, nas escolas, nas aulinhas de futebol, nos cursos de inglês, nos grupinhos de amigos… sempre há e como a gente lida com isso desde a infância interfere no resto da vida.

Em muitos anos de luta tivemos muitas conquistas, as mulheres ganharam muito espaço, mas elas ainda são criticadas por isso…

Sempre houve machismo, sempre haverá, mas depende de você se essas coisas são interferir na sua vida ou não e também depende de você a atitude que vai tomar para que sua vida seja como você quer e não como querem!

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