Performance, fragilidades e a gente de bem

Performance, fragilidades e a gente de bem

Este texto não é exatamente sobre o ocorrido nos dias subsequentes à exibição da performance La Bête, na abertura da 35ª Mostra Panorama de Arte Brasileira, realizada MAM-SP. O intuito é falar sobre um conservadorismo seletivo e suas consequências no direito à livre expressão e ao ofício de artista.

A palavra ofício significa “qualquer atividade que requer técnica e habilidade específica”. O artista por si só é um comunicador que utiliza de sua obra como um espelho de nossos tempos. Portanto o conceito de belo não está em jogo tratando-se de um trabalho artístico, mas sim seu poder de reflexão acerca do nosso cotidiano e, amigos, isso nem sempre é bonito.

Impedir uma expressão por conta de algum incômodo gerado no espectador é, no mínimo, uma atitude paleozóica. Proibamos então Caravaggio e Picasso. Proibamos também os jornais, proibamos as lutas televisionadas ou não e proibamos a figura de Jesus Cristo açoitado e crucificado. No entanto, estamos falando apenas de alguém pelado. Nu. Como veio ao mundo. Não sei você, mas quem vos escreve possui uma vagina e não sente ojeriza ao corpo humano. Meu corpo possui cheiros e é frágil, como qualquer outro corpo. A ausência de roupas expõe esta fragilidade.

Após a polêmica envolvendo a performance com um ser humano nu e a interação de uma criança com os pés e mãos do artista (ação esta supervisionada por sua mãe), foram várias as reais demonstrações de violência física e psicológica como represália por parte de um grupo de pessoas que se sentiu atingida pelo corpo humano, a inocência de uma criança e alguns simples toques. Brada-se ainda pelo fechamento do museu, pela prisão da mãe e pela prisão do performer -por que não ressuscitamos Lygia Clark também e a prendemos, levando em conta que La Bête é inspirada na série Bichos, criada nos anos 60 pela artista?- Engana-se quem pensa que a onda de intolerância começou ou acaba por aí. A família tradicional brasileira não está ferida, muito pelo contrário, ela está espumando e procurando bodes expiatórios. Ela grita, xinga e quebra. Sua única possível doença é a raiva.

 

 

 

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *