Julgamentos, primeiras impressões e pré julgamentos

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Julgamentos

Aprendi, com o tempo, a dar ouvido às minhas intuições. Quase sempre, por mais que me fossem dolorosas suposições, revelaram-se verdades. Assim, posso escolher dar crédito ou rezar para estar errada, mas ignorar não se mostrou, na minha experiência, uma opção acertada.

O mesmo não posso dizer de primeiras impressões, de pré-julgamentos. Eu os condeno e os abomino na grande maioria das vezes, sobretudo quando são fruto de ideias pré-concebidas, de conceitos equivocados. Entretanto, em muitos casos não sou capaz de evita-los e quase não há exceções para os meus desacertos nesse sentido.

Tenho refletido bastante sobre isso e buscado me policiar para que, uma vez mais, diante de uma pessoa ou situação nova, eu já não vá me adiantando e julgamento de forma errada o que vejo. No mais das vezes sinto remorso ou tristeza pelos meus pensamentos. Ao menos, se me pode servir de consolo, sou capaz de reconhecer o erro e de buscar reparar qualquer efeito que isso possa ter provocado.

Lembro-me uma vez em que era aluna de um curso preparatório para concursos públicos e notei um barulho que me atrapalhava. Olhei para o lado e vi um rapaz que, de óculos escuros, parecia batucar com um lápis em uma prancheta no meio da aula. Logo franzi o cenho ao pensar em como era estranho usar óculos escuros em uma sala de aula, bem como era desrespeitoso batucar deslavadamente.

Passados alguns minutos, para minha vergonha, notei que o rapaz era cego e de forma alguma estava batucando.

Estava escrevendo em braile. Nem sei dizer o quanto me senti idiota. Alguns meses depois e éramos muito amigos.

Aprendi muito com ele sobre as dificuldades e a rotina de que não enxerga. Cega, de fato, era eu.

No metrô, dia desses, um menino abordava as pessoas na bilheteria, pedindo trocados. O fato é que se eu for dar uma moeda a todos que me pedirem, rapidamente ficaria eu mesma sem qualquer tostão, mas corri com meu dinheiro para comprar passes, atrasada que estava e irritada com a chuva que já me molhara os sapatos.

Assim que me aproximei da bilheteria, com dinheiro certo para comprar 6 bilhetes, eu nem cogitei dar alguma moeda ao garoto, coisa que vez ou outra eu faço. Além disso, armei uma carranca, capaz de afastar qualquer um. Eis que o menino me chama a atenção e eu, de malgrado, olho para ele pela primeira vez, para ver, consternada e desconcertada, que ele me estendia minha super sombrinha dobrável, que eu havia deixado cair sem perceber.

Nem preciso dizer o quanto me senti mal, ainda mais quando notei que ele era só um menininho, uma vítima provável de um sistema falido e insensível. Meu ímpeto, diante da minha presunçosa indiferença era de pedir a ele uma esmola, uma pouco da sensibilidade que fui perdendo pelo meio do caminho e que a cada dia temo ser irrecuperável.

Fico pensando que não gostaria de ser julgada por uma primeira impressão que tiver causado a alguém, mas ainda assim me surpreendo analisando as pessoas desse modo eventualmente. A cada bordoada que levo da vida sempre que sou menos humana do que gostaria, aprendo, entretanto, que muitas vezes é imprescindível dedicarmos mais um olhar ao que está a nossa volta, até para que possamos receber do universo esse mesmo benefício.

Cinthya Nunes – cinthyanvs@gmail.com

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