PEC 181, aborto e todo o machismo envolvido

PEC 181, aborto e machismo

Já passou da hora de o aborto e o corpo da mulher deixarem de ser tabus em nossa sociedade. Como mulheres (e como homens que respeitam as mulheres), devemos mudar essa realidade, que é mais uma face do machismo e da cultura patriarcal em que nos encontramos.

Nosso Código Penal, editado em 1940, desde sua redação original trazia a possibilidade de aborto em duas hipóteses: quando a gestante está em risco de vida e quando a gravidez é decorrente de estupro. Ou seja, não há crime nestes dois casos. Outros casos foram chegando até o judiciário para que se permitisse o aborto, como as má-formações do feto que impedissem sua vida extrauterina (ou seja, quando as possibilidades de morte após o parto eram muito consideráveis).

Em 2012 foi julgada uma ação no STF (que teve início em 2004) que permitiu o aborto também nos casos de anencefalia. Foi uma decisão histórica (apesar de tardia) e muito se discutiu à época sobre a relação do aborto com a religião e com o feminismo.

Todos os casos de aborto permitidos são hipóteses em que a vida da mulher é reconhecida como superior à do feto, não obrigando àquela a ser uma mera incubadora por motivos de fé ou moral alheias. E essa conquista está prestes a ser perdida.

Enquanto estávamos discutindo e defendendo a descriminalização do aborto (veja alguns motivos nas matérias aqui e aqui), um Projeto de Emenda à Constituição que visava o aumento de direitos em caso de nascimentos prematuros teve uma inclusão que vem sendo muito criticada: a previsão de dignidade humana desde a concepção. Ou seja, está se reconhecendo que a vida existe antes da formação do sistema nervoso central (de forma contrária a que o STF defendeu em 2012) e mesmo antes da nidação! Esta previsão pode levar a entendimentos que criminalizem a mulher que abortar, mesmo nos casos permitidos pela lei e pela jurisprudência. Por isso a PEC 181 vem sendo chamada de “Cavalo de Tróia”.

Se aprovada, a PEC não muda o Código Penal diretamente, mas faz com que sua previsão que permite o aborto se torne inaplicável diante do que diz a Constituição, que é a lei-base do país e nenhuma decisão pode ir contra ela. Na prática, a mulher grávida sofrerá mais um ataque machista decidindo sobre seu corpo e sua vida: deverá correr o risco de morrer apenas para dar a luz; deverá segurar uma criança por nove meses, aguentando sozinha todas as dores e complicações da gravidez, nutrindo sentimentos (bons e ruins) por um ser que não sobreviverá após o parto e, após ter sido vítima de estupro (violência machista n. 1), terá que conceber a vida, filho daquele que a violou em seu íntimo mais profundo, como se o Estado presenteasse o agressor e punisse novamente a vítima, obrigando-a a carregar para sempre a lembrança do ocorrido (violência machista n. 2).

Não existe nada mais desumano que isso! E quer saber o pior? São homens decidindo sobre a vida das mulheres. Primeiramente, temos de ressaltar aqui a falta de representação da população feminina em todos os locais de poder e tomada de decisão e, neste caso, no Congresso Nacional: apenas 10% dos senadores e deputados são mulheres (ou seja, mais um reflexo do machismo). E, por fim, é a imposição de alguns poucos homens sobre o corpo de todas as mulheres deste país. Homens não engravidam, mas homens estupram. Homens são contra o aborto, mas abandonam seus filhos para serem criados por uma sofrida mãe solo. Então como podem ser competentes para decidirem sobre a vida e o corpo das mulheres? Pois bem… isso é machismo!

E a luta do feminismo é para que estas e todas as demais agressões contra as mulheres cessem. Precisamos colocar nossas crenças de lado e nos unir contra mais este retrocesso! TODAS CONTRA 181!!!

 

Foto: Rebeca Letieri/Jornal do Brasil

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