Flashback, revival e velhaquices em geral…

Você é daquelas que adora um retorno ao passado? Guarda agendas velhas, fotos, bilhetinhos só para poder ter o prazer de abrir uma caixa cheia de lembranças uma vez a cada dois anos? E quando há o retorno de algum tipo de roupa, de bijuteria, de um hábito do passado ou uma balada de flashback você se entrega e mata a saudade sem medo de ser feliz (de novo)? Então vamos falar um pouco de flashback, as emoções que atrelamos a essas “revivescências” e como os nossos objetos afetivos vão mudando e sendo ressignificados dentro de nós.

Pois bem, parece que por alguns bons séculos os humanos só queriam saber de andar “pra frente”. Inventores, descobertas, simplificação de roupas, novos hábitos, tudo levava a sociedade em direção ao futuro, ao progresso, ao nunca antes explorado. Retornos pontuais foram feitos em direção à Grécia, Roma, Egito, mas muito em função do modo de pensar, de uma visão de mundo de civilizações antigas que eventualmente retornavam e impactavam a filosofia e as artes.

A partir de determinado momento em que os hábitos e costumes passaram a ser melhor documentados com a literatura, a pintura, e mais recentemente com a imprensa e a fotografia, os humanos passaram a sentir um certo prazer em “homenagear” o passado, contando com referências bem detalhadas para poderem realizar esse retorno.

Flashback é um termo com muitos significados. Aqui ficaremos com o sentido de algo que ocorreu no passado e é inserido num momento atual, ou um retorno rápido a algo ou lembrança de um tempo “antigo”. Outro sentido é o utilizado em narrativas, como um retorno ao passado realizado em cinema ou literatura, temos ainda o significado relacionado a um efeito tardio de alguma droga ou ainda um “revival” de um relacionamento romântico que já parecia terminado.

Pois bem… flashbacks podem trazer umas lembranças legais e outras nem tanto. Pessoas que guardam experiências ruins de infância ou de adolescência podem não querer nem ver determinado objeto comum a essa época ou escutar uma música que as conecte com um momento não tão feliz. Por outro lado, ao ter a chance de se reconectar como passado, podem ter uma boa surpresa, revisitando um período que pareceu “sombrio” mas que, através desse elemento, dessa ponte com o passado, têm a chance de reorganizar suas lembranças de forma mais amena.

Para pessoas que não guardam experiências muito “da pesada”, o flashback de roupas, costumes, músicas e até algo menos tangível, como um churrasco com a turma de escola 10 anos depois, com lembranças do tempo de estudante, podem trazer uma boa sensação de que aqueles seriam tempos mágicos, especiais, dos quais se tem saudade (até porque pequenos desconfortos diários tendem a ser apagados da lembrança, ainda bem!) ou, por outro lado, podem trazer uma sensação de melancolia com relação à passagem do tempo, das pessoas em nossa vida, da rapidez da nossa própria existência. Se a pessoa vai ficar com a primeira sensação, a segunda, ou as duas, irá depender da sua própria estrutura psíquica e da forma como as experiências foram sendo armazenadas em seu “drive”.

É interessante a gente observar que todo revival tem um tiquinho de passado e um tantão de presente. Quando uma pessoa, na adultescência, escuta uma música da sua adolescência, vai sentir uma parte muito pequena de passado nessa experiência, muitas vezes tendo que se esforçar para lembrar de lugares, ocasiões, cheiros, como se as lembranças estivessem escorrendo e tivéssemos que fazer um certo esforço para que não escapem. Mas, com certeza, a parcela maior de sentimento será referente ao presente, uma atualização de sentimentos em relação ao que viveu naquela época, como que a coisa ficou dentro de você após tanto tempo e distanciamento, e o que você tem feito de lá até agora com o seu tempo, com os seus sonhos, com suas amizades, com a sua vida.

Eu vou terminar esse texto com uma história muito significativa de tentativa de revival, de flashback.

Eu passei a infância e a adolescência devorando e colecionando gibis. Não tinha um favorito: a Turma da Mônica, todos os Disney e Luluzinha e Bolinha eram igualmente e desordenadamente devorados. Essa coleção ocupava umas oito caixas daquelas em que se compra leite de caixa no mercado, daquelas que cabem 12 litros. Um belo dia, quando estava para me mudar da casa dos meus pais (tinha lá meus 23-24 anos) eu estava sendo pressionada a carregar essas oito pesadas caixas para a lata de sardinha em que passaria a morar: um quarto e sala de 30 metros quadrados. Olhei as oito caixas abarrotadas de gibis, escolhi o que eu achava que seria mais significativo, mais matador, mais “gosto de infância” para mim, me sentei confortavelmente no quarto do qual estava me despedindo, no conforto da casa dos pais, e me pus a ler, dedicando um tempo e uma atenção que eu nem tinha pra dispor. Foram necessários 10 minutos para entender o quanto eles não conseguiam mais me transportar para aquele cenário. Fiquei ali, pela primeira vez me sentindo “leitora” frente a um gibi. Eu não consegui me sentir um personagem como de fato ocorrera nos anos anteriores. Fiquei desolada. Senti que os gibis me abandonaram, me deixaram pra trás, desistiram de florescer na minha mente criativa, que já não era tão criativa assim, apesar de eu ter acabado de terminar minha primeira pós-graduação, em Literatura, e talvez até mesmo por isso.

Olhei para as caixas. Peguei apenas 6 deles após escolher bastante. Seis gibis que são os que deveriam ser os mais “matadores”, os mais envolventes, que me fizeram por anos mergulhar na história como um dos personagens. Enchi meu porta malas com as oito caixas e dei num sebo de gibis.

E sigo abrindo anualmente os mesmos gibis até hoje, 20 anos depois da constatação fatídica, na esperança de que em algum dia eles façam as pazes com a minha mente quadrada, com a minha criatividade perdida, que eles me desculpem por ter crescido.

E você? Conta pra mim?

Que flashback ainda tem o poder de te transportar, como uma máquina do tempo? Que flashback já se perdeu no seu espaço sideral?

Fonte da Imagem: Google

 

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